O mundo parou para que cada um pudesse olhar para o seu mundo. E dentro dele eu não me via mais a partir do outro, mas a partir de mim mesmo. Quanto tempo será que Narciso conseguiu ficar olhando para a sua própria imagem? Quanto tempo será que ficamos nos relacionando com nossos próprios espelhos? Quanto tempo demoramos para perceber que só podemos existir e sermos completos quando (re)conhecemos o outro em nossas vidas?

Dos desafios da pandemia nos obrigamos a revisitar espaços e construir ou (re)construir relações. E percebemos que o nosso espelho não é suficiente para que sejamos inteiros dentro de nós mesmos. E apesar do presencial ser um espaço com uma imensidão de riquezas para a nossa percepção do outro e de nós mesmos, a limitação dos nossos sentidos, ou a intermediação pela tecnologia nos fez parar e ouvir, e querer ouvir e querer descobrir. Me senti de volta na Caverna de Platão tendo que reaprender, tendo que perguntar para realmente saber, tendo que aquietar a minha voz interna para verdadeiramente me conectar com o outro. E dá-lhe aula de CNV, de escuta ativa, de rapport, de empatia… e usei e uso muito o material da Brené Brown para elucidar e entender a minha vulnerabilidade. Para sair daquele lugar confortável da certeza e descer para o buraco do “eu sinto o que você sente, não sei o que fazer com isso, mas estou aqui com você”.

               E quantas foram e quantas tem sido as vezes que quero ouvir o outro, para me ouvir, para deixar de ter certezas e para ver o mundo sob outras perspectivas. E, para quem aprendeu que a fala e a imagem são os melhores meios de comunicação, resgatar o ouvir e o contar histórias tem ajudado a colocar as coisas no lugar. Esse exercício de ouvir, para conhecer despretensiosamente o que o outro tem a dizer e não aquilo que quero ouvir, é o que transforma e transborda as relações. E cria conexões muito mais profundas do que aquelas que estavam ali sempre ao alcance das mãos. Então, para aqueles que ainda acham que não é possível ter profundidade das relações neste mundo mediado por tecnologias, meu convite vai para que você ouça as histórias, quem sabe de olhos fechados, de dentro da caverna, e que, para quando você volte para a luz de estar com alguém (virtual ou presencial), que esteja verdadeiramente, se permitindo sentir com todos os sentidos, sem tentar achar as respostas que nossa cabeça insiste em querer dar quando alguém fala. Que o exercício seja menos do esforço de silenciar a mente e mais no querer conhecer aquela história, que o exercício seja o do ouvir, de não ter vergonha de dizer ‘não sei’ e que esta seja a porta para a sua relação com você e com o outro.

               E que de escuta em escuta, de história em história, nós possamos tecer, iluminar, aprender e, cada vez mais nos conectarmos verdadeiramente em relações profundas que trazem sentido e significado para nossas vidas. E para aqueles que ainda duvidam que é possível termos profundidade nas relações em um mundo mediado por tecnologias? O meu coração diz que se houver espaço para apenas um dos sentidos seja utilizado, não haverá nenhuma barreira para que as relações se construam! 😉

 

Paula Foroni tem pesquisado e reaprendido todos os dias com líderes, times e organizações. Facilitadora em projetos de transformação organizacional. Eterna aluna, hoje está sentada na cadeira do doutorado em Gestão de Pessoas pela Universidade de São Paulo para fazer muitas perguntas e, quem sabe, descobrir novos caminhos. 😊